terça-feira, 1 de julho de 2008

DIÁRIO DE BORDO - EVENTOS ESPECIAIS FIT-BH/2008

DIA 6, 01 DE JULHO DE 2008

NOTAS SOBRE DISCIPLINAS QUE DEVERÍAMOS ESTUDAR

Marcelo Castilho Avellar
Durante a demonstração de processo da Cia. Clara, no Projeto Encontros, ficou mais uma vez evidente que temos mais facilidade em demonstrar nossos métodos de treinamento que nossos métodos de criação. Freqüentemente, fica explícito o fato de que, eventualmente, começcamos de algum lugar próximo do zero raciocínios que outros campos do conhecimento já vem desenvolvendo há algum tempo.

Bom exemplo disso é a dificuldade que Anderson Aníbal, diretor da Cia. Clara, tem para explicar alguns conceitos que são fundamentais para a criação dos espetáculos do grupo, como a “imagem recorrente”, que funciona como tijolo a ser usado em diversos momentos, não como estrutura rígida, mas como unidade plástica que se transforma a cada momento, de acordo com o contexto da cena. Ou a “ação-comentário”, estrutura análoga na atuação. O discurso de Anderson é nitidamente aparentado com o discurso da ópera sobre o leitmotiv (literalmente, “motivo condutor”). É possível, então, que boa parte do debate que ocorreu, ao longo do último século e meio, sobre o leitmotiv, possa ser incorporado ao nosso debate sobre imagens recorrentes.

Da mesma maneira, a dificuldade em separar conceitos como “movimento” e “ação” poderia eventualmente ser resolvida se os profissionais de teatro se debruçassem um pouco sobre lógica matemática para investigar como ficam seus enunciados em termos de lógicas proposicionais e lógicas de primeira e segunda ordem, ou qual é o status de decidibilidade deles em função de pressupostos usualmente utilizados na criação.


FRASE DO DIA
“Se a gente interpreta, é como se mastigasse a comida do público” – Anderson Aníbal, defendendo que atores devem atuar, interpretar é tarefa do público.

Boa referência para avaliar esta idéia se levada às últimas conseqüências são os filmes de Jean-Luc Godard. É um mestre em descobrir que aquilo que começa antes da ação dramática ou depois dela é tão importante quanto a própria – ou mais. Seus filmes freqüentemente mostram para os espectadores aqueles instantes, no início ou no final do plano, que seriam cortados nas obras de todos os outros autores.


DA SÉRIE “LIÇÕES PARA NÃO ESQUECER”

Na abertura do Fórum de Teatro Latino-americano, Fernando Bonassi se refere ao fato de que o trabalho dos dramaturgos cresce em importância no Brasil. Hoje, segundo ele, a maioria dos grupos teatrais importantes de São Paulo tem dramaturgos em seus elencos. Uma referência histórica importante é a lembrança de que na época de Shakespeare, Lope de Vega ou Molière, dramaturgos e intérpretes estavam juntos, nos mesmos espaços e nas mesmas companhias. Por coincidência, foi a “era de ouro” do teatro como grande arte popular, num fenômeno análogo à febre de ópera no século 19 ou ao apogeu do cinema no início do século 20.

Quem acabou com a lua-de-mel entre companhias e dramaturgos foi a revolução burguesa. Que disfarçou, no teatro, sua defesa da divisão do trabalho com a idéia da individualidade do artista.

Outra fala de Bonassi nos lembra de uma incômoda contradição da produção cultural brasileira: o fato de que seu núcleo industrial (Rede Globo e adjacências) teria se apropriado dos temas e das imagens de grande conteúdo social. Pode ser hora de reler, em todas as nossas escolas de teatro e todos os nossos grupos cênicos, o artigo Abjurei a Trilogia da Vida, de Pier Paolo Pasolini, que discutia momento análogo na Itália: o instante em que os territórios de uma arte de contestação se tornaram territórios de uma cultura de consumo.

Sobre esse tema, vale lembrar uma discussão que surgiu há poucos dias, durante a Oficina da Cena: o fato de que cidades como São Paulo ou Belo Horizonte têm uma cultura de teatro de grupo muito mais forte que o Rio de Janeiro – como se a presença da Globo, estabelecida no Rio como sonho e meta de boa parte dos jovens artistas, inibisse o desenvolvimento dos grupos em grande escala.


COMO APROXIMAR REALIDADES HETEROGÊNEAS

Aristides Vargas, do grupo Malayerba (Equador) expõe um dos contrastes na relação latino-americana com a dramaturgia. Enquanto em seu país a publicação de peças de teatro é, quase sempre, iniciativa individual, dos próprios autores, em Cuba ela integra políticas públicas para o teatro ou a indústria editorial.

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